POLÍCIA FEDERAL INVESTIGA ATO DE GOVERNADOR DO RIO COMO EVIDÊNCIA DE VÍNCULO COM ESQUEMA DO COMANDO VERMELHO

Em operação que apura influência da facção no Palácio Guanabara, despacho de Cláudio Castro para exoneração relâmpago de secretário é visto como manobra para proteger aliado e evitar votação na Assembleia Legislativa.

RIO DE JANEIRO — A Polícia Federal (PF) identificou um ato administrativo assinado pelo governador do Rio de Janeiro, Cláudio Castro (PL), como a primeira evidência direta de sua participação no esquema que investiga a infiltração do Comando Vermelho (CV) no alto escalão do poder executivo estadual. O despacho, que determinou a exoneração às pressas de um secretário, teria sido uma manobra orquestrada para blindar um parlamentar aliado, o ex-deputado TH Jóias, no dia de sua prisão.

Os investigadores tratam a movimentação como um "plano B" acionado para evitar um desgastante e perigoso embate político na Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (Alerj). A operação da PF, deflagrada em 3 de setembro, prendeu TH Jóias por suspeita de lavagem de dinheiro, compra de armas e drones para a facção, e manutenção de relações pessoais com chefes do tráfico.

A Engenharia da Manobra

O cerne da articulação, segundo apurou o Estadão com fontes da investigação, reside na cadeia de suplências. TH Jóias era o segundo suplente do MDB. Com a morte do deputado Otoni de Paula, em maio de 2023, a vaga foi ocupada pelo primeiro suplente, Rafael Picciani. Este, porém, preferiu não assumir o mandato e foi nomeado secretário de Esporte e Lazer no governo Castro. Com isso, TH Jóias pôde assumir a cadeira na Alerj.

A situação mudou com a prisão do ex-deputado. Pela Constituição, cabe à casa legislativa estadual decidir sobre a manutenção ou revogação da prisão de um de seus membros. Para escapar desse processo, foi acionado um mecanismo rápido: no próprio dia da prisão, 3 de setembro, Cláudio Castro assinou uma exoneração relâmpago de Rafael Picciani do cargo de secretário.

A medida foi tão urgente que obrigou a publicação de uma edição extraordinária do Diário Oficial do Estado. Com a saída da Secretaria, Picciani retornou automaticamente à Alerj para ocupar a vaga que era originalmente sua. Esse movimento fez com que TH Jóias perdesse o mandato de imediato, pois voltava à condição de segundo suplente. Sem status de parlamentar, a decisão sobre sua prisão saía da alçada da Assembleia, sendo transferida para a Justiça comum.

Dilema Evitado e a Sombra do CV

Para os agentes da PF, a manobra tinha um objetivo claro: poupar a Alerj e, por extensão, o governo, de um debate político explosivo com duas saídas igualmente indesejáveis.

A primeira opção seria a Alerj revogar a prisão de TH Jóias – um ato visto como extremamente impopular, dado o histórico do ex-parlamentar, condenado por tráfico em 2007, e as acusações atuais de ligação com a cúpula do CV.

A segunda, e considerada mais arriscada pelos investigadores, seria a Assembleia autorizar a manutenção da prisão. Isso representaria uma ruptura pública com um suposto representante dos interesses da facção dentro do Legislativo, enviando um sinal de quebra de acordos e articulações com líderes do tráfico.

O ato de Castro, portanto, é interpretado pela força-tarefa como uma intervenção para desarmar esse cenário de alto risco, controlando politicamente as consequências da operação policial. A exoneração de Picciani, assinada pelo governador, é o elo documental que liga a cúpula do Executivo estadual à articulação em defesa de TH Jóias.

A defesa do governador Cláudio Castro nega qualquer irregularidade e afirma que todas as suas ações foram legais e dentro das prerrogativas do cargo. A PF segue com as investigações e deve incluir a análise do despacho no relatório final a ser enviado ao Supremo Tribunal Federal (STF), que autorizou a operação. O caso expõe as suspeitas de que o crime organizado não apenas infiltrou setores do Legislativo, mas também teria encontrado ressonância em atos do próprio Palácio Guanabara.

Postar um comentário

Sua opinião é importante!

Postagem Anterior Próxima Postagem

Formulário de contato