Jaime Cavalcante Alves é reitor do Instituto Federal do Amazonas (Ricardo Oliveira/CENARIUM e Reprodução/Conif | Composição: Paulo Dutra/Cenarium) |
MANAUS (AM) – O Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) tornou réu o atual reitor do Instituto Federal do Amazonas (Ifam), Jaime Cavalcante Alves, por vazamento de informações envolvendo casos de assédio no campus de Eirunepé, no sul do Amazonas. Documentos obtidos com exclusividade pela CENARIUM, após três meses de investigação jornalística, mostram que o chefe da instituição foi indiciado pela Polícia Federal (PF) pelos crimes de violação de sigilo funcional e condescendência criminosa, previstos no Código Penal.
Autal reitor da Ifam foi indiciado pela Polícia Federal (Reprodução/pF) |
A reportagem encaminhou uma mensagem ao reitor da instituição de ensino, às 14h46 do dia 26 de setembro, pedindo posicionamento em relação à ação penal e o teor da denúncia contra ele. O pedido de esclarecimento não foi respondido até as 16h30 dessa sexta-feira, 3.
“Os indícios suficientes de autoria e materialidade se encontram demonstrados nos seguintes documentos: i) e-mail enviado pelo psicólogo a Jaime Cavalcante no dia 08/08/2023 contendo documento sigiloso; ii) e-mail enviado por Jaime Cavalcante a cinco servidores do Ifam contendo documento sigiloso; iii) […] iv) depoimento de Jaime Cavalcante prestado à Polícia Federal, que confirma o envio do e- mail a servidores do IFAM no dia 08/08/2023”, diz trecho do documento. Veja:
Relatório final da Polícia Federal. (Documento obtido pela CENARIUM) |
Um servidor da instituição, que aparece como vítima no relatório final da PF em Cruzeiro do Sul (Acre), segundo e-mail vazado, teve seu caso interpretado de forma diferente pelo MPF. A instituição denunciou o funcionário que reportou possíveis irregularidades cometidas pela cúpula do campus em Eirunepé.
A reportagem apurou que o MPF solicitou à Justiça a homologação de um acordo para os réus, prevendo o pagamento de um salário mínimo (R$ 1.518 em 2025). A CENARIUM questionou o órgão para que o procurador da República Valdir Monteiro Oliveira Junior, responsável pelo documento, esclarecesse o ponto, mas, até a última atualização desta edição, não houve retorno.
Indiciamento por condescendência criminosa
Jaime Cavalcante foi indiciado pela Polícia Federal (PF) por ter repassado, via e-mail, informações sigilosas sobre denúncias de assédio e violência psicológica, relatadas pelo psicólogo do Ifam em Eirunepé, Alexandre Soares, contra o professor Isac Neto da Silva e outros servidores, segundo consta no e-mail encaminhado ao reitor. O psicólogo disse ter sofrido ameaças e pedia a sua transferência para Manaus. O e-mail, para justificar o pedido, foi encaminhado pelo reitor a outros servidores, incluindo o próprio professor acusado.
Segundo investigações da PF, o reitor enviou a mensagem em agosto de 2023, dois meses antes de o psicólogo divulgar o caso em grupos internos da instituição. O relatório final apontou indícios suficientes de materialidade e autoria para os crimes de violação de sigilo funcional e condescendência criminosa, com base em depoimentos, documentos analisados e checagem dos e-mails institucionais.
No seu depoimento, Jaime disse que encaminhou a mensagem para avaliar se havia motivo para conceder a remoção de Alexandre e para garantir sua segurança. O reitor negou intenção de vazar informações e afirmou que o próprio denunciante “já havia espalhado as denúncias dentro da instituição”. A investigação apontou que o envio do reitor aconteceu antes da divulgação feita por Alexandre e sem seguir as normas internas do Ifam.
O relatório final da Polícia Federal, datado de 9 de outubro de 2024, registrou que o e-mail enviado ao reitor do Ifam, apesar de intitulado como pedido de remoção, continha informações sobre condutas consideradas inadequadas e possivelmente criminosas dentro do instituto. O documento destacou que o reitor encaminhou quase imediatamente a mensagem para outros servidores, entre eles alguns dos denunciados, fato que “causou estranheza na PF”.
E-mails
O e-mail foi enviado inicialmente ao endereço jaime.ifam.com.br e outros sete destinatários às 15h13 de 8 de agosto de 2023. Na mensagem ao reitor, o então psicólogo da instituição pede remoção de Eirunepé (AM) para Manaus após ações de combate a assédio sexual na instituição elevar a tensão entre ele e os docentes da unidade. Na carta a Jaime Cavalcante, o servidor cita “ameaça de morte institucional” feita pelo professor do instituto federal, Marco Aurélio Anadam Mello.
A mensagem também traz documentos, que somam seis anexos e citam integrantes da cúpula do Ifam por prática de omissão em relação às denúncias de assédio. Carlos Yuri Damasceno, atual corregedor do Ifam, é mencionado em um dos materiais enviados ao reitor “como alvo de pedido de investigação”. O arquivo é nomeado como “Petição de Abertura de Inquérito – Carlos Yuri […]”. Na mensagem, Alexandre aponta que o corregedor é “citado como quem faz o ‘jogo virar’ contra quem procura denunciar supostos crimes no Ifam”.
E-mail enviado pelo psicólogo Alexandre Soares (Reprodução/PF) |
Outro servidor mencionado no material vazado é Leandro Amorim Damasceno. De acordo com o e-mail, o servidor seria suspeito para atuar em procedimentos que envolvessem o psicólogo e que ele chegou a ser citado por Isac Neto, professor denunciado à PF por assédio contra uma aluna, como alguém que protege assediadores no campus de Eirunepé (AM).
Inicialmente, denúncia foi relatada internamente (Reprodução/PF) |
Ifam se posiciona
A CENARIUM questionou o Ifam sobre as denúncias de omissão envolvendo os denunciados por suspeita de omissão, relativização de apurações contra “aliados” em casos de assédio contra alunas, chantagem, ameaça e vazamento de informações sigilosas. Entre eles Jaime Cavalcante Alves, além dos servidores Leandro Amorim e Carlos Yuri.
“Não há qualquer evidência que sustente acusações de obstrução de investigações ou proteção a servidores […] As denúncias envolvendo autoridades do IFAM já foram objeto de investigação pela Polícia Federal e pela Corregedoria do Ministério da Educação, que possuem a competência para avaliar e apurar tais casos” afirmou a instituição de ensino no útimo dia 18 de agosto.
O Ifam reiterou, ainda, que: “Assédio não será tolerado em nenhuma circunstância; todas as denúncias são apuradas com rigor e transparência; nossa gestão trabalha em parceria com a Controladoria-Geral da União (CGU) e demais órgãos de controle para fortalecer políticas institucionais de prevenção e combate ao assédio”, concluiu a nota.
Fonte: Revista Cenarium